Morte na areia
- Mara Cornelsen
- 19 de abr.
- 2 min de leitura
Havia muita gente ao redor. Curiosos, preocupados, alguns com a respiração em suspenso, aguardando o desfecho daquela cena. Parecia filme, mas era a mais pura realidade. O homem estava ali, estendido na areia da praia, desacordado. A médica e os bombeiros lutavam para trazê-lo de volta. Massagens intensas no peito, choques com aquele aparelhinho que na ficção parece ter o infinito poder de ressuscitar alguém, e muita tensão.
Um grupo de heróis anônimos lutando pela vida de um desconhecido. A maré estava subindo e as ondas lambiam as areias da praia no seu eterno vai e vem, alheias ao drama que se desenvolvia há poucos metros. Entardecia. O céu apresentava uma intensa variação de tons de azul, mesclado por nuvens em forma de algodão. Seria uma tarde normal de praia para um sem número de veranistas aproveitando o início de um feriadão, não fosse o alerta de que havia uma pessoa boiando no mar.
Os salva-vidas foram comunicados. Pediram reforços à equipe do Águia 04 da Polícia Militar, o helicóptero que estava em patrulhamento naquele momento. Não demorou e os ocupantes da aeronave localizaram a vítima. Um destemido bombeiro saltou do helicóptero bem próximo ao afogado, alcançou-o e o levou a nado até a areia. E nesta hora todos começaram a rezar por um milagre.
Viaturas dos bombeiros já estavam próximas com seus equipamentos de salvamento. O Águia 04 pousou e a dra. Janaina com um enfermeiro e sua equipe iniciaram os procedimentos necessários. Massagem cardíaca, oxigênio, soro, mais massagens. Outros bombeiros foram chegando. Solidários calçavam luvas descartáveis e se revezam na massagem, afastando-se somente sob ordens da médica, que então usava o aparelho de choque. Imediatamente retornavam com as mãos no peito do homem, sincronizados, empurrando para cima e para baixo.
Os curiosos também se revezavam na observação à distância, obedecendo ordens dos bombeiros para que ficassem afastados. Os inevitáveis comentários de que "com o mar não se brinca" e "o mar é traiçoeiro" surgiram várias vezes, entre orações murmuradas, e perguntas sobre quem era e de onde viera a vítima. Ninguém sabia e naquele momento só importava a febril torcida para que ele - fosse quem fosse, viesse de onde viesse - voltasse a respirar.
Foram 50 minutos de luta incessante até a médica decretar a morte.
G.C., 54 anos, masculino, anotou a doutora em sua prancheta, lamentando ter perdido esta batalha. "Fizemos o possível, mas ele já estava há muito tempo na água", explicou. Os bombeiros, todos com os semblantes constritos, retiraram-se com a mesma agilidade com que tinham chegado. O corpo foi removido para uma unidade de saúde próxima e depois para o Instituto Médico Legal. O Águia 04 subiu aos ares levando sua pequena e heroica equipe, triste, mas já pronta para um novo chamado, a qualquer momento. Afinal, o mar é traiçoeiro e com ele não se brinca.



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