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Adeus à Tribuna

  • Foto do escritor: Mara Cornelsen
    Mara Cornelsen
  • há 3 dias
  • 3 min de leitura

Jornal Tribuna do Paraná com a última versão impressa

Segunda feira, 10 de novembro de 2025. Pela última vez é publicada a edição da Tribuna do Paraná impressa. Ela acaba justamente no dia da semana em que fazia o maior sucesso. Era lida por toda a Grande Curitiba. Não havia salão de beleza, barbearia, mercado, delegacia que não tivesse seu exemplar, sempre disputadíssimo após um grande clássico no futebol ou um crime de repercussão. Não se vendia Tribuna por assinatura. O leitor tinha que ir à banca de jornais para garantir a sua e por isso também virou a queridinha dos donos de bancas, que aproveitavam a oportunidade e vendiam outros de seus produtos.


Vivi 35 anos de um jornalismo intenso - na área policial - naquela redação das Mercês, sob a batuta do ex-governador e empresário Paulo Pimentel, que delegava poderes ao Mussa José Assis, ao Francisco Camargo e posteriormente ao Carlos Tavares - o Charles - e ao sobrinho dele, Rafael Tavares. A todos o meu mais profundo agradecimento. Charles e Mussa recebam o meu abraço aí, no plano superior, para onde se mudaram há algum tempo. Tenho certeza que aprendi jornalismo raiz, honesto, com os melhores.


Aprendi as primeiras letras com as manchetes da Tribuna, que meu pai comprava todos os dias e levava para casa. Eu, aos três anos de idade, copiava as letrinhas em papel de pão. Tinha ânsia de aprender a ler e escrever. Quis o destino que me apaixonasse pela escrita e cursasse Jornalismo na Universidade Federal do Paraná. E onde fui trabalhar? Na Tribuna, lógico. Acho que estava escrito nas estrelas!


Com tristeza soube de sua "morte" em papel. Ela continua a ser publicada on-line, como a a maioria dos jornais e revistas no Brasil. Morre o corpo, fica a alma. É assim que sinto a mudança. Não tem mais barulho de rotativa, infernal e hipnótico barulho daquela maquina gigante que cuspia os jornais no início de cada madrugada, levando ao leitor o resultado de uma luta diária pela melhor e mais bem escrita notícia.


Que delícia era pegar o exemplar no dia seguinte, sentir o cheiro da tinta, sujar a mão com o papel jornal, e ler o que havia sido produzido no dia anterior. Super alegria quando a edição saía "redondinha", sem erros ou com um "furo de reportagem". O orgulho ia a mil! E que sofrimento quando as coisas não saíam tão certinho, sim, porque muitas vezes os erros na escrita passavam, como uma troca de letras ou um verbo mal colocado. E a gente ficava "jururu". Porém não havia muito tempo para lamúrias. O jornal tinha que sair no dia seguinte e a luta recomeçava.


A redação da Mercês fervilhava nos finais de tarde. Logo que entrei, em 1980, novatos e veteranos disputavam as melhores máquinas de escrever, muitas delas com fitas gastas ou faltando teclas, chegavam a tirar sangue dos dedos de quem as usava. A partir das 18 horas surgia uma nevoa sob as cabeças pensantes dos jornalistas. Era fumaça de cigarro. Sim, todo mundo fumava na redação e ninguém se importava. E não adiantava nada se importar, o "fumacê" continuava. Só muitos anos depois é que os cigarros foram proibidos e quem não deixou de fumar, tinha que ir até o pátio externo para saciar seu desejo de nicotina.


Entre tapas e beijos todos nós nos gostávamos muito e nos respeitávamos como profissionais. Nem sempre concordávamos com as mesmas coisas, mas as amizades perduram até hoje. Com a chegada dos computadores a redação ficou mais silenciosa e limpa. As famosas bolinhas de papel que voavam de um lado para outro sumiram do "front". Mas as piadinhas não. Nem as fotos esquisitas dos "coleguinhas" que terminavam penduradas no mural para deleite da galera. Nem os apelidos, alguns bem sugestivos.


A transição do papel para o computador foi bem difícil, especialmente para os mais antigos. E nesta época, graças do pessoal da Informática, aprendemos que além de Jesus o computador também salvava. Ou seja, depois de perdermos inúmeras matérias já prontas, por ter esquecido de "salva-las", vinha um engraçadinho lá do fundão a gritava: "avisei que não é só Jesus que salva! Tirava sarro do infeliz repórter que estava se descabelando por ter perdido o trabalho de um dia inteiro.


São tantas as recordações que eu passaria um dia todo falando sobre isso, com aquela saudade que dói na alma. Sou muito grata aos colegas que me colocaram nas páginas da última edição impressa, um presente que vou levar para o resto da vida. Por mais de três décadas fui a "Mara da Tribuna". O jornal virou meu sobrenome, do qual muito me orgulho.


Não existe mais a redação, a rotativa se calou, mas o jornalismo continua pulsante com novos repórteres e uma nova forma de produzir e publicar notícias e prosseguir fazendo e registrando a história. Sucesso e longevidade é o que eu posso desejar à alma da Tribuna.

3 comentários


Giselle Ulbrich
Giselle Ulbrich
há 2 dias

Quantas história hein Mara! Nossas e dos outros. Quantas vidas passaram pelos nossos bloquinhos e teclados, pelas páginas da tribuna!! Tenho uma felicidade imensa de ter tido você na redação como professora, tutora de jornalismo e da vida. E de tê-la hoje como uma grande amiga. Você é um grande exemplo para todos nós Mara.

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cborio
há 3 dias

Que delícia de crônica. Tão bom recordar esse tempo. Infelizmente a evolução fez com que o jornal impresso se tornasse quase obsoleto. Mas tudo o que vivemos naquela redação ficará para sempre na memória. Não esqueço da sensação indescritível de subir na rotativa e ver o jornal sendo produzido. Tantas histórias e amizades para a vida toda. Valeu demais, obrigado Tribuna!

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Jorge Javorski
Jorge Javorski
há 3 dias

Show o teu texto Mara querida. É realmente uma grande perda para o jornalismo paranaense. Também tive boas recordações dos meus tempo de repórter na Tribuna, especialmente na época de Carnaval, quando encarnava o personagem de Jorginho Reco-Reco, juntamente com a Adelita Abre-Alas e o Dante Repinique. A versão digital, certamente, é o início da derrocada da Tribuna.

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